Política

Ensino médio pode ter 40% das aulas a distância; MEC é contra



Uma proposta em análise no Conselho Nacional de Educação (CNE) estuda permitir que até 40% da carga horária do ensino médio possa ser feita a distância. Se aprovada e homologada pelo Ministério da Educação (MEC), ela vai alterar as Diretrizes Curriculares do Ensino Médio, de 2012.
Em nota ao G1, a pasta afirmou discordar da mudança (veja nota abaixo) .
A medida não é consenso nem mesmo dentro do CNE. Entre os especialistas há quem diga que pode haver uma precarização do ensino, outros defendem que a mudança é necessária para acompanhar os avanços tecnológicos.
Uma primeira versão do texto foi apresentada pelo relator e conselheiro Rafael Luchesi ao conselho, mas ainda precisa ser discutida e votada para chegar ao Ministério da Educação. O tema voltará para pauta da próxima reunião, em 9 de abril.
Segundo Eduardo Deschamps, presidente do CNE, a ideia ainda é preliminar e haverá audiência pública para debater o tema. “Há um entendimento que o EAD no ensino profissional é interessante, mas ainda precisamos de uma avaliação mais profunda.”
Deschamps afirmou que o conselho discutiu se 40% da carga horária oferecida a distância não seria um percentual muito alto. Além disso, outra dúvida é se as disciplinas obrigatórias previstas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) poderão ser ensinadas neste formato ou somente de maneira presencial. Ainda não há definições. “O processo ainda vai ser discutido”, disse Deschamps.
Se a medida for aprovada, as redes e escolas terão autonomia para definir ferramentas e modelos. Para Deschamps, a constante evolução da educação permite inovações. “Temo que o conservadorismo deixe de colocar a educação em outro patamar.”
Quem já se manifestou contra a resolução foi o integrante do CNE Cesar Callegari. Ele teme que, ao pararem de frequentar a escola todos os dias, adolescentes deixem de colher os aprendizados da convivência.
“Eu considero que temos de garantir o território de vivência dos alunos. A escola é um território de afetos. Convivendo, crianças e adolescentes aprendem coisas que não estão nos livros, como os laços de solidariedade, por exemplo”, afirma.
Callegari esclarece que sua opinião contrária não é uma “visão jurássica” sobre o ensino a distância. “Só acho que a tecnologia deve complementar e estar a serviço da escola, mas não deve substituir a própria escola e os professores.”
Reforma do ensino médio
O que está em debate na educação a distância é uma resolução normativa – e não propriamente um aspecto da reforma do ensino médio, sancionada pelo presidente Michel Temer em fevereiro de 2017.
Apesar de ser uma medida independente, já era prevista em uma brecha do texto da reforma: “os sistemas de ensino poderão reconhecer, mediante regulamentação própria, conhecimentos, saberes, habilidades e competências. Entre essas formas estão incluídas (…) a educação a distância ou educação presencial mediada por tecnologias”.
MEC discorda
Segundo o Ministério da Educação, a pasta não encaminhou nenhuma sugestão ao CNE e discorda da proposta em discussão. Confira o comunicado enviado pelo MEC ao G1:
“O texto das Diretrizes Nacionais Curriculares do Ensino Médio ainda é objeto de discussão no Conselho Nacional de Educação – órgão responsável pela definição e aprovação – sem prazo para terminar e passará ainda por audiência pública. Apenas depois de todo esse processo é que a proposta será encaminhada ao MEC pelo CNE para homologar ou não pelo Ministro da Educação. O CNE é um órgão independente e tem autonomia para propor sobre o tema”.
Repercussão
Para o professor João Cardoso Palma Filho, da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), a implementação do ensino a distância seria prejudicial aos alunos. “O formato atual já apresenta muitas dificuldades. Os jovens não têm formação consolidada para acompanhar um conteúdo de forma não-presencial”, diz.
Ele prevê que o nível de qualidade do ensino médio cairia. “Nós não temos esse preparo. Os professores não foram formados para preparar aulas e materiais de ensino a distância. Seria tudo sem controle e sem acompanhamento. A proposta é estapafúrdia. Os alunos precisam de um professor ali, para tirar as dúvidas de imediato”, afirma o docente.
Ele levanta também a questão da empregabilidade. “Provavelmente, algumas instituições se aproveitariam da medida para dispensar professores. Haveria uma economia efetiva – porque ninguém está pensando em qualidade, e sim em gastar menos”, completa.
Neide Noffs, titular da Faculdade de Educação da PUC-SP, também se posiciona contra a transferência de parte da carga horária para o ensino a distância. “O adolescente precisa de socialização. Esse formato até poderia ser interessante para educação continuada, mas não para essa etapa inicial. Os jovens têm de saber respeitar o outro, viver em sociedade”, diz. “A medida, se aprovada, será apressada, sem a devida discussão com a sociedade. Um episódio muito mais político do que educativo”, afirma.
A professora aborda também a questão da infraestrutura das escolas. “Uma mudança como essa alcançaria o Brasil todo. Tenho acompanhado as dificuldades dos estudantes que não têm acesso à internet. Os colégios precisariam ter mais computadores e um sistema estável”, diz Neide.
“Educadores teriam de pensar mais em uma mudança que é crucial para o Brasil. Temos de focar em como manter os alunos na escola e em como torná-los críticos e conscientes. Essa medida não me parece a saída”, conclui.

G1



Redação

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